No vocabulário do design português, não há uma tradução exacta para “pitch”, o que não é grave, apenas irónico, tendo em conta que também não há uma tradução exacta para a palavra “design”.
O “pitch” é aquele momento em que o designer apresenta a sua proposta ao cliente. Pode querer dizer “apresentação” ou “proposta”, mas também conota “lance” ou “jogada”; uma tradução – mais honesta do que aproximada – poderia ser “atirar o barro à parede”.
É um dos momentos mais ritualizados e mitificados na vida de um designer; é o momento do tudo ou nada – a negociação dramática onde se concentram todas as capacidades de argumentar um projecto, uma solução. Se a vida dos designers fosse uma série de advogados, o “pitch” seriam as alegações finais; se fosse uma série policial, seria aquele momento em que o detective consegue finalmente resolver o caso; se fosse um Western, seria um duelo ao meio-dia.
Tanto quanto sei, não há séries de televisão sobre design gráfico; a coisa mais próxima que já vi chama-se Mad Men, e passa-se numa agência de publicidade ficcional em Nova Iorque nos anos 1960s. Já li em qualquer lado que o título é um trocadilho com “Ad Men”, mas a legenda que explica o termo no começo do primeiro episódio dá também a entender “Madison Avenue Men” – uma referência à avenida nova-iorquina onde se situam as agências publicitárias mais prestigiadas.
Embora a agência Sterling Cooper seja ficcional, muitos dos seus produtos e clientes não o são – a sua invejável carteira de clientes inclui a Kodak, a Clearasil e o candidato republicano à presidência, Richard Nixon –, mas alguns detalhes históricos não são exactos, tendo sido alterados para melhor servirem a narrativa – no primeiro episódio, por exemplo, Don Draper, o protagonista, inventa, num momento de inspiração desesperado, o “It’s Toasted” dos cigarros Lucky Strike, que na realidade já existe desde 1917.
Mas o grande tema de Mad Men não é a publicidade por si só, mas as relações pessoais antes da invenção do Politicamente Correcto. Cada episódio é a reconstrução meticulosa e crua de um dia-a-dia em que cada conversa, cada gesto, sobretudo entre homens e mulheres, seria considerado ofensivo pelos padrões actuais, e em que o racismo também nunca anda muito longe. Em Mad Men, os homens são executivos; as mulheres, ou são secretárias ou ficam em casa a cuidar dos filhos; de cada homem, espera-se que esteja casado, que tenha uma ou duas amantes sem grandes sentimentos de culpa. Um cliente judeu é um acontecimento raro e inesperado; os poucos negros são empregados de mesa, de limpeza, ou ascensoristas.
Em algumas séries de época, como a portuguesa Conta-me Como Foi, os protagonistas são mais simpáticos do que a época em que vivem e os “maus” são figuras de papelão que desbobinam os preconceitos que se esperam deles. Mad Men nunca cai nessa armadilha; se simpatizamos com os protagonistas é graças à escrita subtil de Matthew Weiner, o criador e argumentista principal da série, que já tinha usado os seus consideráveis talentos a escrever os Sopranos.
Mas, ao contrário dos Sopranos, a tensão em Mad Men só muito raramente chega a ser física. Alguns dos momentos de clímax mais inspirados correspondem frequentemente ao “pitch”, o momento em que se tenta “vender” a ideia de uma campanha a um cliente. Um dos melhores exemplos – que já foi considerado pelo Design Observer como um dos melhores discursos de “pitch” de sempre– é o último episódio da temporada, em que Draper usa a apresentação de um novo projector de slides da Kodak para reflectir sobre a desintegração lenta do seu próprio casamento.
Finalmente, o grande tema de Mad Men acaba por ser uma angústia que todos os designers conhecem, e que o genérico da autoria de Kyle Cooper Imaginary Forces representa bem: a queda livre em direcção àquele momento em que tudo se pode resolver: o próximo momento de inspiração, o próximo “pitch”.
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